segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Final da Semana Limbo: só não faz quem não quer

Depois de incursões limbícas pelos mais diferentes espaços de convivência da sociedade recifense – uk pub, club nox, rua da moeda e, claro, candeias beach -, chegou a hora de Santo Amaro entrar nesse que (citando a wikipedia) é "um lugar fora dos limites do Céu, aonde se vive a plena felicidade natural, mas privado da visão beatífica de Deus".

Vindo pela Agamenon Magalhães sentido Olinda, logo na descida do viaduto da João de Barros, primeira à direita, ao lado da creche. Se eu estivesse recitando essas palavras 13 anos atrás, estaria dando o endereço de um terreno baldio. Há 12 anos, no entanto, que as cartas que chegam ali são endereçadas ao Espaço Cultural Santo Amaro, um oásis no meio da comunidade que já foi apontada como a mais violenta do país.

Foi na cidade de Goiana que nasceu o nosso envolvimento com Santo Amaro, em meio a uma oficina de Autosustentabilidade na Música, promovida pelo Espaço Cubo a convite da Fundarpe. Nessa experiência conhecemos Tito que, além de ter se tornado um bróder, se tornou também o presidente do Conselho de Moradores da comunidade de João de Barros (salve JB!) e um dos diretores do Espaço Cultural Santo Amaro.

Como, então, poderíamos deixar a JB de fora da nossa Semana Limbo de Agitações Culturais e Divertimentos Sortidos? "Não poderíamos", eu vos respondo. E assim, chegando no sábado 29, adentramos pelos portões verdes do Espaço Cultural Santo Amaro de mala, cuia e parafernália, prontos pra dar o pontapé inicial com a oficina de Produção Radiofônica - oferecida pelos paulistas do Massa Coletiva.

Parêntese: O Massa Coletiva é um dos 40 Pontos Fora do Eixo que estão espalhados nesse Brasilzão de meu deus, e hoje são um dos coletivos mais atuantes dentro do Circuito Fora do Eixo, principalmente na parte de comunicação.
Além de serem um Ponto Fora do Eixo e compartilharem com o Coletivo Goma de Uberlândia a função de coordenadoria regional dos Pontos Fora do Eixo do Sudeste, a galera ainda produz um programa de rádio semanal e um projeto de discotecagem itinerante, o Independência ou Marte.

Para a oficina, fizemos uma parceria com a Lan House da comunidade, que fica bem do lado do Espaço Cultural. Lá os meninos do Massa exibiram o vídeo release do Independência ou Marte e explicaram como funciona a rotina de um programa de rádio pros alunos que nunca tinham tido contato com produção de conteúdo em áudio.

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tio felipe animando a garotada

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memelo soundsystem no vídeo release do Independência ou Marte

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primeiros contatos com o Portal Fora do Eixo

O mote, claro, é: com pouquíssima estrutura, qualquer um já pode criar sua rádio. Um microfone de computador normal não custa nem dez reais, o programa que usamos pra gravar áudio é free e as ferramentas pra hospedar o áudio online existem às toneladas. O que falta, então? Conteúdo. Esse daí, vem fácil com um pouco de pesquisa e um mínimo de andança pelo mundo. Quer ver? Saímos da lan e andamos cerca de 45 segundos até uma garagem próxima onde uma banda de samba ensaiava seu repertório - sentiu cheiro de conteúdo, né? Em pouco tempo já montamos o nosso equipamento e o que era ensaio se tornou uma gravação, filmagem e várias fotos.

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indo pro ensaio da banda de samba Pra te conquistar

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"e aí, vamo gravar?"

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felipe e jovem fazendo a mágica

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participação do MC Nielson, dos Guerreiros da Rua, mandando um freestyle no meio do samba

Pro segundo dia de ocupação do Espaço Cultural e último dia da Semana Limbo, preparamos duas apresentações: a banda Chãocéu e o grupo de hiphop Guerreiros da Rua. Queríamos iniciar um contato mais próximo com as pessoas que moram ali na comunidade, e nada melhor que oferecer um divertimento gratuito pra começar com pé direito uma relação.

Montamos o palco, passamos o som, abrimos os portões do Espaço e a Chãocéu começou.

Nossa estratégia logo começou a dar resultado: aos poucos, quem estava de bobeira em casa ou na praça em frente começou a migrar pra dentro do Espaço, timidamente ocupando algumas mesas dispostas no salão. Os que não viram os cartazes colados pela comunidade apareceram curiosos pra saber que movimentação toda era aquela.

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cartaz colado no Arapuca Bar, perto do Espaço

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Chãocéu

Enquanto a Chãocéu se apresentava, estávamos transmitimos o show na íntegra para Rádio Fora do Eixo. Felipe e Jovem, do Massa, estavam mais uma vez no comando da transmissão e na discotecagem dos intervalos, e tudo estava sendo retransmitido na lan house, ó:



Quando a Guerreiros da Rua entrou em cena, a surpresa: no auge do público, tínhamos um enxame de crianças de todas as idades curtindo demais o show dos MCs de Santo Amaro - até break elas dançaram. Pra gente, que buscava interlocução com os moradores de lá, não tinha mesmo melhor público que esse. Foi emocionante o quão dispostas a interagir elas estavam. Que o digam os "tios" do Massa, que fizeram do microfone e do fone de ouvido da transmissão o playground da garotada. No áudio da transmissão, que gravamos e postaremos aqui no blog logo mais, dá pra ouvir os gritos, mensagens e toda a vontade de participar da brincadeira.

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guerreiros da rua e as crianças

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guerreiros da rua e mais crianças

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crianças mandando bem no break

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crianças mandando amor pro circuito fora do eixo

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tio felipe e o assédio ao fone



Outra surpresa foi, após o show, conhecer a galera do Coletivo Gambiarra. Mais uma confirmação de que estamos no caminho certo com as pessoas certas: o Gambiarra é um coletivo formado por moradores da comunidade de Santo Amaro (e membros do Guerreiros da Rua) que já desenvolvem um trabalho forte de produção audiovisual e em outras formas de mídia independente, documetando as ações de graffiti e hiphop que produzem. Golaaaaaaaaço! Histórias, vivências, conhecimentos e ferramentas de produção, tanta coisa pra trocar e aprender com quem já vem buscando o mesmo fim que a gente, em meios tão diferentes. O Espaço Cultural Santo Amaro ainda vai ver muita agitação dentro de seus portões, e se tudo der certo, não seremos nós quem vamos agitar - são essas pessoas, que já têm uma carga de afeto e intimidade com a comunidade de uma forma que nós não poderíamos ter.

Final da Semana Limbo, missão cumprida. Movimentamos duas boates, uma rua e uma comunidade contando com quase nenhuma grana, mas tendo uma equipe de voluntários super conectada, dispostíssimos a ver a coisa acontecendo e aceitando a remuneração solidária pelos seus serviços. Vivenciamos realidades de fora do estado e de dentro das micro-regiões que envolvem os locais que ocupamos, e essas perspectivas são enriquecedoras demais quando se busca entender quem é que faz acontecer a cultura hoje no país.

E o mais bonito de tudo: isso não é nada que você não possa fazer.

Um comentário:

Filipe (Peu) disse...

Bonito !! Eh isso ae caralho.. !! Deu ate pra escutar o rebuliço daqui de casa. !!